terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Desafios e prioridades na formulação das PPJ no Brasil atual

A essência deste documento é auxiliar os jovens locais a identificarem por si e através de sua própria experiência de vida os principais desafios apresentados pelo mundo político e social à juventude durante o processo de formulação das PPJ e sua efetivação enquanto política de estado. Num primeiro momento vale lembrar a importância dessa iniciativa como Política de Estado e não de Governos, pois uma vez as PPJ definidas como tal, sua implementação não mais ficará vinculada a governos e nem a princípios partidários.
Um dos principais pontos a serem observados quando tratamos de juventude e seus direitos, está na séria dificuldade encontrada pelos jovens para concluir seus estudos e ingressar no ensino superior. Se essa é uma dificuldade presente em todos os grandes centros urbanos, quanto mais na realidade da escassez de oportunidades de nossas pequenas cidades do Vale do Ivaí, frente a uma juventude em sua grande maioria, de princípios e costumes rurais, onde quase sempre precisam abrir mão dos estudos para auxiliar no sustento da família principalmente nas épocas de safra. Em nossa região o corte de cana e a colheita do café têm recrutado muito mais jovens do que as escolas.
Nosso país adotou um modelo econômico nas últimas décadas que não teve outra função que não promover a exclusão social e a juventude foi um dos segmentos mais afetados nesse processo, pois pelo fato de não ter sido reconhecido como segmento da sociedade há tempos atrás, acabou ficando sem acesso aos serviços públicos básicos e sem a oportunidade de desfrutar de seus direitos fundamentais, o que torna o jovem um quase cidadão, já que desfruta de uma cidadania incompleta.
Nos últimos anos o governo federal vem trabalhando com afinco na definição das PPJ e sua implementação, assim como fomentado as discussões onde se identifiquem os principais pontos a serem priorizados de acordo com a realidade local de cada comunidade.
O jovem tem o privilégio de exercer influência tanto sobre as gerações mais avançadas quanto nas menos avançadas, o que o torna um elo intergeracional de suma importância na ligação entre o país como conhecemos e aquele que pretendemos construir no futuro. Isso implica em primeiro lugar na certeza de uma boa influência embasado em boas idéias e certeza das possibilidades e viabilidade das ações provenientes dessas idéias, que devem priorizar a facilitação para o engajamento do jovem no desenvolvimento de atitudes que promovam mudanças éticas, sociais, políticas e ambientais.
Partindo do princípio de que o jovem pede hoje, não por garantia de proteção simplesmente, mas por direitos e oportunidades de emancipação, podemos começar a enumerar alguns dos desafios encontrados pela juventude mobilizada e pelo poder público no processo de formação das PPJ no Brasil.
O primeiro desafio que gostaria de expor é o Desafio do Desenvolvimento Integral, onde cada área da vida cotidiana do jovem deve e precisa passar por transformações que sejam práticas no que diz respeito ao seu crescimento como ser humano e ao mesmo tempo contem pontos para a sua preparação para o mercado de trabalho. Um início para o Desenvolvimento Integral é a erradicação do analfabetismo juvenil, garantindo que todo jovem conclua seus estudos desde o básico até o superior e mais importante, com qualidade no ensino público, que de forma geral ainda deixa a desejar. O segundo passo desse desafio é o mercado oferecer formação profissional e uma quantidade maior de postos de trabalho, com condições dignas e com remuneração justa para juventude. A educação e o trabalho são dois pontos do Desenvolvimento Integral que devem andar sempre juntos, com a mesma visão de investimento e sempre com a mesma oferta de mecanismos de desenvolvimento já que o jovem de hoje não pode pensar numa preparação prévia para conseguir um emprego, afinal de contas, na maioria dos casos, o banco da escola está ao lado da cadeira do escritório ou até mesmo no chão de fábrica. A maioria da juventude atropelou aquela imagem de desinteressado, hoje a educação e o emprego são os assuntos que mais interessam a essa parcela da sociedade.
A cultura é mais um ponto do Desenvolvimento Integral, haja vista que a criação e democratização de equipamentos culturais estão entre as maiores reivindicações dos movimentos juvenis. Mas o que a juventude entende por democratização da cultura vai muito além da condição do jovem consumir cultura, mas trata de oferecer condições para a formação de uma cultura para a juventude e uma cultura de juventude, onde as expressões artísticas da juventude possam ser produzidas e exerçam repercussão por toda a sociedade.
O desenvolvimento integral trata ainda das Tecnologias da Informação no âmbito da inclusão digital, o direito ao lazer, ao esporte e qualidade no tempo livre entre outros, mas a nossa realidade local pede uma atenção especial pela Juventude do Campo. Com uma oferta cada vez menor de oportunidades de lazer, cultura, saúde e principalmente trabalho e renda, a juventude do campo passa por um processo acelerado de Êxodo Rural Juvenil. O Governo Federal já oferece programas de incentivo à permanência do jovem no campo, incluindo preparação para o trabalho rural, que é um negócio que vem sofrendo transformações que não estão sendo acompanhadas pelo pequeno agricultor. É preciso compreender que o campo é gerador de sua própria riqueza e que o jovem está entre os principais atores na construção desse processo. O ponto chave do jovem do campo é aprender os mecanismos de atividades que produzam uma vida de boa qualidade e com boa alternativa de renda sem que ele deixe sua terra, sua casa e sua família, preservando assim suas tradições e vínculos e derrubando o estigma de que pra ser alguém na vida, o jovem não deve continuar no campo. É importante citar também a importação de profissionais nos municípios de nossa região, quase sempre vindos dos grandes centros, enquanto os jovens locais, ao invés de receberem investimento para a preparação e conseqüente preenchimento dessas vagas, acabam subempregados nas grandes cidades e com mais sorte, formação superior e emprego longe de sua cidade, efetivando assim o desvincular com suas raízes.
A juventude ainda tem criado uma consciência ambiental bem diferente daquela que praticamos até hoje. Aqui na região do Vale do Ivaí, a juventude está organizada em diversos municípios em Ecoclubes, que trabalham ativamente em defesa do meio ambiente, tanto com trabalhos de conscientização como em mutirões de limpeza e defesa de rios florestas e nascentes.
Finalizando o que diz respeito ao Desenvolvimento Integral, quero lembrar da questão da Saúde, não apenas como direito constitucional, mas como mecanismo de transformação na condição juvenil de protagonista no universo das estatísticas da saúde. Entre os principais temas que surgem nos debates sobre saúde juvenil estão as drogas, as DST e a AIDS, a gravidez indesejada, os acidentes de trânsito e as mortes e lesões por violência. Os governos Federal e Estadual há muitos anos vêm produzindo campanhas e ações que visam combater e prevenir esses problemas, mas sempre partindo de uma visão geral, o que muitas vezes escapa à realidade de cada cidade ou localidade. Alguns dos pontos importantes que devem ser discutidos nas Conferências Locais de Formação das PPJ é um plano de ação dentro da realidade local para o combate e prevenção dessas questões, observando suas singularidades sem que se chegue ao patamar do caráter preventivo como único meio de abordagem, visando exclusivamente as condutas de risco, podendo chegar ao arcaico princípio do controle social, já que 70% das mortes entre os jovens ocorrem por fatores e agentes externos evitáveis. Vale lembrar que a juventude sempre rejeitou toda e qualquer tentativa de controle. É preciso observar também a preservação da Diversidade Juvenil no que diz respeito a cultura, deficiências, sexualidade, raça, religião, tradições e crenças.
Quero colocar como segundo desafio a Quebra das Resistências no que diz respeito a compreender juventude como SEGMENTO SOCIAL e o jovem como cidadão de direitos, sempre observando as especificidades de caráter etário e sociocultural. Nos atos de mobilização, as decisões que sempre foram tomadas individualmente passam a ser discutidas de forma coletiva, o que muitas vezes provoca boicotes e vetos, fragilizando as relações de poder e criando situações explícitas de resistência aos processos participativos.
No universo das prioridades vou assinalar alguns tópicos, porém a essência de cada um eu deixarei que seja discutida nos grupos de trabalhos que acontecerão nas conferências. As principais são Ampliar o Acesso ao Ensino e a Permanência em Escolas de Qualidade, o que se difere do primeiro ponto do desafio do Desenvolvimento Integral, já que aquele trata da oferta de oportunidade e esse, da forma de atuação tanto dos que oferecem quanto dos que recebem, criando um mecanismo de atuação interativo, onde os próprios jovens possam dizer quais as melhores formas de manter este sistema atualizado, atuante e sempre atingindo as expectativas da juventude. Na seqüência das prioridades encontramos a Geração de Trabalho e renda e a promoção de uma vida saudável assim como os direitos humanos e as políticas de afirmação da juventude; estimular a cidadania ao jovem e sua participação social, por meio da conscientização de que ele é um cidadão de direitos; e a melhoria da qualidade de vida no meio rural e nas comunidades tradicionais como quilombos, reservas indígenas e assentamentos de jovens trabalhadores sem terra.
As PPJ devem estar à disposição de todo e qualquer jovem brasileiro, mas é importante discutir ações de emergência com base naquelas parcelas desse segmento que sofrem com a fragilidade social como miséria, fome e violência. Para isso é preciso que exista por parte do poder público, em todas as esferas do executivo uma ação transversal, que englobe todos os equipamentos do sistema público de forma a integrar as ações, não deixando ao encargo de uma só via administrativa esse planejamento e implementação. Ficando aos jovens a responsabilidade na formulação, monitoramento e avaliação das PPJ.
A juventude sozinha não vai mudar o país, mas o país jamais será mudado sem a força da juventude organizada, é certo que o jovem precisa do Brasil, mas o Brasil também precisa do jovem. O jovem é igual nos anseios gerais, mas sempre singular nas atitudes, como disse o sociólogo Boaventura de Souza Santos, “devemos lutar pelas igualdades sempre que as diferenças nos discriminem e lutar pelas diferenças sempre que a igualdade nos descaracterizar.

Silvio Côrtes

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